Matemática dos professores e professoras de Matemática

Uma afirmação, já bem aceita, é que ninguém ensina o que não sabe. Em Matemática, uma pergunta natural que segue essa afirmação é: mas que Matemática professoras e professores precisam saber para ensinar?

Este é um tópico de pesquisa na área de Educação Matemática e tem tido diversos avanços muito interessantes em termos de compreender:

  • que conhecimento (matemático) é esse;
  • como professores desenvolvem tais conhecimentos.

Este texto é focado em futuros professores e professores atuantes, não vou falar de avanços em pesquisa científica, mas deixarei algumas sugestões de onde buscar referências, combinado? Quero apresentar algumas considerações minhas sobre exemplos que eu gosto muito e que oferecem bons indícios de quais são os conhecimentos específicos que professores e professoras de Matemática precisam ter e, principalmente, como eles são diferentes de conhecimento Matemático de matemáticos profissionais.

Em especial, vou focar em conteúdos do Ensino Fundamental. De qualquer forma, quero comentar que este texto, mesmo sendo apenas minha seleção de alguns exemplos, pode ser de interesse para professores e para formadores de professores.
Último comentário antes do primeiro exemplo: já notei que vou precisar de mais de um texto.
A seguir, apresento apenas o primeiro (acompanhe o blog para não perder o segundo exemplo).

Exemplo 1: multiplicação

Retirado de: BALL, Deborah Loewenberg; HILL, Heather C; BASS, Hyman. Knowing mathematics for teaching: Who knows mathematics well enough to teach third grade, and how can we decide? American Educator, Washington, EUA, v. 29, n. 3, 2005. – texto publicado por uma associação de professores dos EUA.
Adoro esse subtítulo que os autores usaram, numa tradução livre: “quem sabe matemática suficiente para ensinar crianças da terceira série?”.

A Ball e a Hill são pesquisadoras da área de Educação Matemática e o Bass é matemático. Eles trabalharam juntos em muitos artigos e projetos sobre o tema “conhecimento do professor de matemática” (busque por esses nomes no Google Acadêmico e você terá leitura por um bom tempo).
Eis um exemplo que eles usaram, traduzido e com meus comentários:
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Quase todo mundo que terminou o Ensino Básico ainda deve se lembrar de como resolver a multiplicação acima. Todos os professores de matemática devem saber executar o algoritmo que resulta no resultado correto ilustrado na próxima figura.
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Mas dar uma aula sobre multiplicação não é resolver uma multiplicação enquanto os alunos assistem. Professores “precisam explicar, ouvir e examinar resoluções de estudantes. Eles precisam ser capazes de escolher bons exemplos e modelos. Essas ações exigem mais perspicácia e compreensão de Matemática.” (p. 17). Por exemplo, para notar que a resolução a seguir está errada. E ir além, considerar que a resolução está errada apenas por um deslize no posicionamento dos termos ou há algo mais?
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Identificar o procedimento errado é necessário, mas também é preciso notar que a resposta final deveria ter chamado a atenção de estudante, não seria 245 um valor pequeno demais já que 25×4 já formam 100?
E agora? Qual foi o erro?
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Um pouco mais difícil de imaginar, certo?
Os alunos podem explicar suas soluções e esse é um tipo de atividade bastante rica, mas com 30, 40 alunos na sala, não é viável fazer tal dinâmica o tempo todo. Tudo isso, lembrando que os alunos também pedem explicações e justificativas.

Na primeira resolução errada, como você explicaria que está fazendo 35×20 e não só 35×2 como aparece na conta?
Além da possibilidade de falar sobre (e escrever) as ordens e falar sobre a decomposição dos números, os professores precisam saber usar diferentes representações. Como esta, usando o modelo de área:
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Qual é a área de um retângulo de lados 25 e 35? (Preciso escolher unidades?). Só que, para poder usá-la de forma produtiva, seus alunos precisam estar cientes do que representa comprimento e o que representa a área (Quanto esses conceitos já estão cristalizados para que possam ser usados como fundamento para um outro conteúdo?). Por quê, ou melhor, o quê desse retângulo representa a multiplicação inicial? E como essa representação ajuda na explicação das etapas do algoritmo?

Se um aluno, depois ter visto essa representação, resolver a multiplicação assim:
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Tudo bem? É preciso fazer alguma sugestão, algum alerta?

E se outro aluno resolver assim:
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Com essa resolução não algorítmica (e correta), aproveito para comentar sobre a importância de escolher exemplos e determinar a sequência na qual se pretende apresentar atividades.
Será que 35 x 25 é um bom exemplo para justificar o algoritmo tradicional? Não seria melhor ter usado 12 x 43, onde não tem nenhum “vai um”? A representação no modelo retangular vai ficar razoável com essas novas multiplicações?

Engenheiros/as, arquitetos/as e economistas precisam ser capazes de discutir essas questões para executar bem os seus trabalhos? Do meu ponto de vista, de jeito nenhum! Na escola, as explicações e justificativas que fazem sentido para os alunos e que são ancoradas em conhecimentos anteriores permitem o desenvolvimento de novos conhecimentos, e isso não significa que o aluno é capaz de elaborar uma aula de multiplicação de números com dois algarismos. Isso é atribuição de professores de Matemática, que têm que criar situações na sala de aula onde 30 estudantes diferentes consigam “dar sentido” ao conhecimento em foco no momento.
Os autores do texto seguem argumentando sobre a necessidade de “medir” esse tipo de conhecimento. O texto é de 2005, e depois de muito desenvolvimento nessa vertente de “criar testes para medir”, a primeira autora já se afastou desse foco para valorizar a observação de professores em atuação como forma de desenvolver tais conhecimentos. Enfim, não é o meu objetivo aqui discutir como medir se um professor tem esse conhecimento ou não, e avaliação é uma área enorme e com muitos objetivos diferentes.

A mensagem final que quero deixar, e o texto da Ball, Hill e Bass também destaca, é “unless we, as educators, are willing to claim that there is professional knowledge that matters for the quality of instruction and can back that claim with evidence, we will continue to be no more than one voice among many competing to assert what teachers should know.”(p. 46). Traduzindo: a menos que nós, educadores, estivermos dispostos a reivindicar que existe um conhecimento profissional que faz a diferença em termos de ser capaz de dar boas aulas e pudermos dar suporte a essa reivindicação com evidências, nós vamos continuar sendo apenas mais uma voz entre várias competindo para afirmar o que professores devem saber.

Nos comentários do post vamos falar dessa multiplicação, ok? Fique à vontade para discordar e para perguntar, afinal, aqui é dá licença…

Pomodoro

Olá pessoal!

Como está a capacidade de concentração para estudar? Ontem (dia 04/10/2021), algumas redes sociais ficaram fora do ar e muitos memes surgiram de pessoas comentando como o dia foi produtivo… que coisa, não?!
Acabei lembrando de como, algumas vezes, tenho dificuldade de me concentrar, de deixar as distrações de lado e focar no trabalho (que, no meu caso de pós-doutoranda, é estudar!).
Resolvi escrever este post para compartilhar minha técnica favorita. O nome dela é POMODORO. Parece que o nome vem do formato bem comum de timer de cozinha, sabe? Aqueles que se usa pra lembrar de alguma coisa que está no forno.
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Meu primeiro contato com a “técnica do pomodoro” foi durante o doutorado. A universidade tinha sessões de “Shut up and write” – sim, você leu e traduziu corretamente – “Cale a boca e escreva”. Esse era o nome oficial da sessão oferecida pelo pessoal de treinamento da pós-graduação, sério mesmo, veja a seguir o um print do meu relatório, onde eu colocava todas as atividades do ano!

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Enfim, vamos à técnica… O pomodoro é uma sessão de estudos/trabalho onde, durante cerca de duas horas (ou pelo tempo que você quiser), você irá focar em uma tarefa.

Primeiro:

Determine uma tarefa que você precisa fazer – ler um artigo, resolver uma lista, preparar uma aula, etc. Pode ser qualquer tarefa, você só precisa estimar o tempo para concluí-la ou para avançar um tanto que considerar razoável.

Segundo:

Programe um despertador (celular, timer de cozinha, etc) para tocar nos seguintes intervalos: 25 min + 5 min + 25 min + 5 min + 25 min + 5 min + 25 min.

Terceiro:

Nos intervalos de 25 min você SÓ pode focar na tarefa e em mais nada. Não pode celular, não pode conversar, não pode olhar rede social e nem e-mail, não pode parar para comer e nem para usar o banheiro.

Quarto:

Nos intervalos de 5 min faça tudo que não podia fazer no item anterior, só NÃO pode trabalhar na tarefa.
Pronto, é só isso! Tente fazer uma sessão, o trabalho rende mesmo?!

Algumas ideias, vindas de experiências que já vivi, e que eu recomendo.
Junte os amigos e façam sessões de pomodoro juntos (ao mesmo tempo e no mesmo lugar)! Já fiz isso com o pessoal da universidade, e fazíamos uma pausa maior para o almoço. Eram dias muito produtivos! Apenas precisávamos de uma sala com muitas tomadas, fora isso, bastava alguém para controlar o tempo. Chegamos ao ponto de conseguir verba institucional para comprar o almoço e bolo para os lanches desses dias de pomodoro! Chegamos a ter 15 pessoas na mesma sala, cria-se um clima muito legal de motivação.
Já fiz na casa de amigos, cada um de uma área fazendo suas coisas, e depois de fazer pomodoros a tarde toda, cozinhávamos juntos!

Por fim, ajuste os intervalos para a sua necessidade do dia. Nos dias produtivos, os 25 minutos podem ficar curtos e você se pega trabalhando nos 5 minutos de intervalo… isso não pode acontecer e vai atrapalhar o esquema de recompensa e descanso do processo (parece que nosso cérebro é sistemático assim mesmo). Ajuste seu despertador para 50+10 ou para qualquer divisão que lhe pareça mais adequada.

Existem sites que marcam o tempo, como este aqui que permite ajustar os intervalos com toda flexibilidade. Existem vários apps que fazem esse trabalho no celular, procure “pomodor timer” na sua loja de aplicativos. E existem vídeos do YouTube, ao vivo ou não, que colocam música de fundo, filmam uma pessoa estudando e, nos intervalos, rola conversar pelo chat – o BlaBlaLogia já fez algumas sessões.

Lembrando que a maior parte do tempo, faço sozinha mesmo. Você já conhecia esta técnica? Gosta? Pretende tentar? Conta pra mim! Ou qualquer dúvida, comentários pode escrever … aqui é “dá licença” fique à vontade!