Como desestimular os bons alunos
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Os bons alunos são muito chatos. Eles são arrogantes, pretensiosos,
 vem nos incomodar nas nossas salas, fazem perguntas que não sabemos 
responder, são exigentes e, em última análise, ameaçam nossas posições
 acadêmicas e nossas convicções democráticas e igualitárias.
Depois de muitos anos de experiências acumuladas por mim e por meus 
colegas, resolvi elaborar este decálogo, que espero contribua para 
eliminar tão perniciosa casta de nossa Universidade.
 
1. Mostre-se sempre infeliz. Esteja triste e desanimado. Diga, nas suas
 aulas, que a carreira acadêmica não vale a pena, e que as perspectivas 
de emprego sao remotas. 
Insista em que a Universidade está sucateada ou que esta dominada por
 caciques impenetráveis, segundo sua preferência. Insinue sempre que eles 
escolheram de maneira errada sua profissão e que aquele seu colega de 
escola que era bem burrinho e vagabundo ganha muito mais que você. Fomente 
a idéia de que, no mercado de trabalho, o que mais importa é saber inglês 
e se dar bem na entrevista. Jamais deixe escapar que o conhecimento e a 
pesquisa fornecem momentos de autêntica alegria.
 
2. Comece suas aulas as 8 horas e termine as 10 horas, sem intervalo, e 
queixe-se de que não dá tempo de dar tudo o que voce sabe. Não dê tempo aos
 bons alunos para refletir ou questionar. Lembre sempre que o objetivo de 
sua aula é mostrar que voce sabe muito mais que eles. Não vacile: humilhe 
os bons, para que aprendam.
 
3. Suas provas devem ser metade muito fáceis e metade muito difíceis. O 
objetivo é que, na medida do possível, todos os alunos tirem nota 5, o que 
contentará os medíocres e diminuirá a vaidade dos bons. Se algum aluno bom,
 motivado pelo desafio, faz as questões difíceis e não tem tempo para as fáceis,
 seja inflexível: dê nota 5 para ele.
 
4. Suas provas devem ser longas, porque a velocidade é democrática. Aplique 
provas longas que possam ser resolvidas decorando 13 fórmulas adequadas às 
palavras chave das perguntas. Alunos bons podem pretender deduzir as fórmulas, 
mas não terão tempo. Zero neles. 
 
5. Aplique provas onde a segunda questão dependa da conta feita na primeira, 
a terceira da conta da segunda, e assim por diante. Ficam muito elegantes, e 
mostram sua imaginação e compreensão global do tema. A vantagem é que um aluno
 bom pode errar na primeira conta e tirar zero em conseqüência, o que aumentará
 muito sua reputação de professor rigoroso.
 
6. Jamais devolva as provas corrigidas para seus alunos. Os alunos bons podem 
pretender estudar erros e aprender com eles no dia seguinte. Quem sabe até 
encontram um erro seu. A justificativa para esta atitude é simples: um 
estudante da Universidade de Utrecht, em 1734, reclamou da nota que tinha 
tirado na prova de Anatomia 23 anos antes e, como 
o professor não guardava a cópia, a Universidade foi obrigada a trocar sua 
nota, de 5 para 6. Não há registros do nome desse estudante, mas todos sabem 
que foi assim mesmo.
 
7. Como voce não devolve as provas, será fácil abaixar alguns pontos na nota
 dos alunos bons, por motivos fúteis. Faça com que o processo de revisão seja
 o mais constrangedor possível, para que o aluno se envergonhe de pretender 
saber por que tirou 9 e não 10, e aceite o desconto nivelador. Marque uma 
reunião na sua sala para todas as revisões, chegue atrasado, e garanta uma boa
 fila: o aluno se sentirá mal de se queixar do 9 quando seus colegas estão 
se queixando do 3.
 
8. Os trabalhos em grupo sao uma boa oportunidade de infernizar a vida dos 
alunos bons. Nunca coloque os alunos bons no mesmo grupo: eles podem se 
potencializar e ficar melhores ainda. Coloque o aluno bom com colegas bem 
fraquinhos e chatinhos, de maneira que ele tenha que fazer tudo e sofra. 
 
9. Os painéis nos congressos de iniciação cientifica também sao uma excelente 
oportunidade de desestimular alunos bons. Passeie entre os painéis admirando 
aqueles posters que incluem texturas coloridas, relevos, e os mais avançados
 meios de apresentação computacional e posterológica. Despreze posters 
apressados e manuscritos.
 Não deixe de enfatizar que, nesta etapa da vida, é mais importante a forma que o 
conteúdo. 
 
10. Nas reuniões de departamento, defenda sempre as propostas mais burocráticas e 
formais. Pré-requisitos, horários rígidos, barreiras para trancamento e mudança
 de turma. Proponha, sempre, incluir mais disciplinas no seu curso. É 
necessário ter os alunos bons bastante ocupados com bobagens formais, para que 
não perguntem.
 
                                                     J. M. Martínez
                                                        Abril 2003

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